Contos Tradicional Finlândes.
Era uma vez uma abastada casa de campo em que vivia um camponês com os seus três filhos. Acontecia que, cada vez que ele acabava de proceder à sementeira da Primavera, surgia uma noite de tempestade estival que destruía tudo. E assim sucedeu ao longo de doze anos consecutivos. Finalmente, cansou-se da situação repetitiva e decidiu:
— Vou parar de semear. De qualquer modo, nunca obtenho nada em troca.
O filho mais velho pediu-lhe então que o deixasse cultivar as terras e obteve autorização.
Assim, o jovem adubou o campo e semeou-o. Mas surgiu a noite da tempestade estival e repetiu-se tudo o que costumava acontecer ao velho agricultor.
Na Primavera seguinte, o filho do meio pediu ao pai que o deixasse tentar a sorte. Obtida autorização, trabalhou as terras e procedeu à sementeira. Quando calculou que chegara a noite da tempestade, ficou de vigília. À meia-noite, desencadeou-se um temporal tão furioso que derrubou todas as árvores do bosque. Ele entrou a seguir na casa de banho e depois foi deitar-se. Quando de manhã se levantou, a destruição era tão absoluta como nas vezes anteriores.
Ao chegar de novo a Primavera, o filho mais jovem pediu ao pai que o deixasse também experimentar, mas este último hesitava em o autorizar.
— Vou parar de semear. De qualquer modo, nunca obtenho nada em troca.
O filho mais velho pediu-lhe então que o deixasse cultivar as terras e obteve autorização.
Assim, o jovem adubou o campo e semeou-o. Mas surgiu a noite da tempestade estival e repetiu-se tudo o que costumava acontecer ao velho agricultor.
Na Primavera seguinte, o filho do meio pediu ao pai que o deixasse tentar a sorte. Obtida autorização, trabalhou as terras e procedeu à sementeira. Quando calculou que chegara a noite da tempestade, ficou de vigília. À meia-noite, desencadeou-se um temporal tão furioso que derrubou todas as árvores do bosque. Ele entrou a seguir na casa de banho e depois foi deitar-se. Quando de manhã se levantou, a destruição era tão absoluta como nas vezes anteriores.
Ao chegar de novo a Primavera, o filho mais jovem pediu ao pai que o deixasse também experimentar, mas este último hesitava em o autorizar.
— A única coisa que se consegue é acumular desgraça sobre desgraça!
No entanto, acabou por ceder. Chegada a noite da tempestade, o rapaz ficou de vigília e, quando se aproximava, dirigiu-se a uma ponte que havia no meio da propriedade e deitou-se por baixo.
Pouco depois, três pássaros pousaram nela e, de súbito, transformaram-se em donzelas, que se despiram e atiraram as roupas ao chão. Uma delas adiantou-se até às terras e começou a pisar a sementeira, imitada prontamente pelas outras duas. Naquele momento, o rapaz surgiu de debaixo da ponte e apoderou-se da roupa. Duas regressaram imediatamente e conseguiram arrancar-lhe as suas das mãos, mas a terceira, que não teve tanta sorte, ficou ali. Aproximou-se então do rapaz e perguntou:
— Que será de mim, se me impedires de partir?
— Não te deixo ir com essa facilidade. Primeiro, terás de pagar ao meu pai a colheita de dez anos e a cada um dos meus irmãos a de um Verão.
— Com quê, se não tenho nada?
E, como não tinha coisa alguma para oferecer, ela sugeriu que a desposasse. Quando ele concordou, entregou-lhe um anel e disse:
— Coloca-o no dedo. Indica que estou comprometida contigo.
O rapaz soltou-a e ficou combinado que ele se encarregaria dos preparativos e ela compareceria a uma hora previamente determinada. O jovem mandou publicar os banhos e, na data estabelecida, os convidados compareceram para aguardar a noiva, mas como nunca mais aparecia, o rapaz principiou a preocupar-se. Quando soaram as badaladas do meio-dia, a sua ansiedade acentuou-se. Pouco depois, ouviu um ruído estranho e ela surgiu finalmente numa carruagem puxada por muitos cavalos cinzentos.
A boda foi celebrada com um lauto banquete e o troar de canhões. O rei, que vivia no palácio próximo, enviou um serviçal incumbido de perguntar:
— Porque estão a disparar sem o meu conhecimento?
O homem reapareceu e informou:
— Celebram um casamento. O filho do nosso vizinho uniu-se a uma mulher muito linda.
O monarca decidiu ir ver a noiva e ficou de tal modo deslumbrado com a sua beleza que disse ao noivo:
— Já que conseguiste uma mulher tão maravilhosa, esta noite terás de derrubar todo um bosque de carvalhos.
O jovem ficou apavorado com a ordem e perguntou-se: "Como posso executar esse trabalho gigantesco?" E lamentou-se à esposa:
— Como conseguirei uma coisa dessas?
— Não te preocupes! — aconselhou ela, com desprendimento.
Pediu a uma serviçal que, quando badalasse a meia-noite, mandasse aparelhar o melhor cavalo ruão e o trouxesse para junto da entrada. Em seguida, indicou ao marido:
— Monta o cavalo ruão e dirige-te a galope ao bosque de carvalhos do rei. — Entregou-lhe um pequeno machado e acrescentou: — Quando derrubares o carvalho mais baixo, dirás: "Que caiam todos os carvalhos, juntamente com este!"
Ele assim fez e as árvores foram todas abatidas. Por fim, tornou a montar o cavalo ruão e regressou a casa.
— Como correram as coisas? — quis saber a esposa.
— Estão todas as árvores derrubadas.
Na manhã seguinte, apareceu o rei, que declarou:
— Já que és tão forte, deves erguer todas outra vez.
Ao ouvir estas palavras, o jovem voltou a ficar apreensivo.
— Como conseguirei cumprir uma ordem destas?
Mas a esposa recomendou-lhe:
— Não te preocupes, que isso se fará num abrir e fechar de olhos.
A meia-noite, uma serviçal foi acordá-los.
— Está na hora...
O cavalo ruão já aguardava à entrada, e a esposa recomendou ao marido:
— Quando entrares no bosque, ergue o carvalho mais pequeno e diz: "Eu levanto este, e os outros que se levantem por si!"
Ele assim fez e, com efeito, todos os carvalhos se ergueram de novo. Em seguida, regressou a casa, e a esposa perguntou-lhe:
— Como correram as coisas?
— Todas as árvores estão novamente de pé!
Depois, o rei determinou que procurasse as chaves do seu palácio, as quais se tinham extraviado na época do seu avô.
— Como és tão forte, aposto que não há impossíveis para ti.
O jovem, convencido de que estava mais uma vez em apuros, comunicou à esposa:
— Agora, quer que encontre as chaves do palácio, perdidas no tempo do seu avô.
— Não te preocupes, que hão-de aparecer — assegurou-lhe ela. — Monta-te no cavalo ruão, de manhã cedo, que te conduzirá a uma igreja, cujas portas se abrirão espontaneamente. Entras, pegas nas chaves que estão penduradas na parede ao fundo e, ao saíres, não deves olhar para trás.
Ele cavalgou até à igreja no cavalo ruão, recolheu as chaves e preparou-se para sair. Naquele momento, o espírito protector do templo gritou:
- Que fizeste, jovem? Pegaste em alguma coisa! Pára!
Ele deu meia-volta... e o cavalo atirou-o ao chão.
O molho das chaves soltou-se-lhe da mão na direcção do cavalo e prendeu-se num dos cascos. O animal recolheu-o com os dentes e levou-o à dona, a qual as apresentou ao rei, com as palavras:
— Que terá sucedido ao meu marido, com as coisas que lhe mandas fazer? E muito possível que tenha acontecido urna desgraça.
— Não te preocupes — recomendou o monarca. — Uma mulher como tu não tem dificuldade em conseguir outro marido.
Não obstante, ela esperou o seu regresso durante um ano.
Esgotado esse lapso de tempo, o rei ordenou imperiosamente que o desposasse. Ela não teve outro remédio senão acompanhá-lo à igreja, mas primeiro explicou à serviçal:
— Não acredito que o meu marido volte, mas o que te vou dizer é para o caso de reaparecer. Quando chegar à igreja virá a voar. Repara em que direcção segue e diz-lhe que vivo para além do mar negro e do mar branco, num palácio submerso no mar vermelho. Em todo o caso, não poderá chegar lá, de maneira alguma.
Enquanto o jovem se arrastava penosamente até lá, passou diante de uma igreja, em cujo adro havia três homens, que lhe gritaram:
— Não sigas em frente e vem cá!
Acercou-se e viu que tinham três coisas que queriam repartir. eram idosos e haviam levado toda a vida ocupados com aquela distribuição, mas ainda não tinham conseguido pôr-se de acordo e pediram ao jovem:
— Reparte estas três coisas entre nós.
Referiam-se a um chapéu, um par de botas e uma espada. O jovem pegou no primeiro e perguntou:
— Que se pode fazer com isto?
— Se o puseres na cabeça, ninguém te verá.
Pô-lo imediatamente e perguntou:
— Vêem-me, agora?
A resposta foi unânime:
-Não!
Quando quis saber o que se podia fazer com as botas, informaram-no:
— Numa única passada, podes chegar até onde a tua vista alcança.
— E com a espada?
— Utiliza-se na guerra. Se a empunhares, tombarão todos os teus inimigos.
Num abrir e fechar de olhos, calçou as botas e chegou a voar no momento em que a esposa entrava na igreja. Quando saiu, ela perguntou à serviçal que rumo seguira.
Tinha-se escoado algum tempo desde que ele empreendera o voo para leste. Chegara a uma casa nova, fizera-se passar por tratador de cavalos e deitara-se para dormir atrás da mesa. Entretanto, o hospedeiro e a hospedeira colocaram sobre a mesa comida deliciosa, e o primeiro observou:
— Eu convidava o forasteiro a fazer-nos companhia, mas talvez não lhe apeteça comer.
O forasteiro ouviu o que diziam. O hospedeiro chegou junto dele e, sacudindo-o, disse-lhe:
— Levanta-te, hóspede, e vem comer!
Então, ele levantou-se e exclamou:
— Mas que mesa tão bem servida!
O hospedeiro e a esposa acharam muita graça.
Após o jantar, dormiram toda a noite sem interrupção. Na manhã seguinte, o hospedeiro tratou-o ainda mais cordialmente e mostrou-lhe os seus armazéns. Começou por um cheio de cobre e disse:
— Agora, vamos ver outro.
Este encontrava-se cheio de prata.
Quanto ao terceiro, abarrotava de ouro. Todavia, quando o abandonavam, o hospedeiro olhou em volta e bradou:
— Onde se terá o homem metido?
O jovem pusera o chapéu e enchera a mochila de ouro. O outro fartou-se de o procurar, sem resultado, e terminou por se perguntar de novo:
— Onde demónio se terá metido?
Apercebeu-se então de que faltava uma quantidade de ouro considerável e reconheceu:
— Devia tratar-se de um ladrão, apesar de se fazer passar por tratador de cavalos.
Entretanto, o fugitivo já percorrera uma grande distância através dos campos. Quando tirou o chapéu, o hospedeiro avistou-o e exclamou:
— Lá vai o bandido!
No entanto, o jovem continuou a afastar-se rapidamente, à procura da esposa. Depois de caminhar durante um dia inteiro, chegou ao mar branco. Percorreu então as duas margens e viu uma casa em que vivia uma rapariga que aquecia o quarto e lhe perguntou:
— Para onde queres ir?
Não sem notar que ela tinha um nariz que media seguramente vinte centímetros, respondeu que pretendia chegar ao outro lado do mar.
— Posso levar-te lá no meu barco, mas ficarei com uma das tuas mãos, como forma de pagamento. — Não preferes que te pague em ouro? — perguntou ele. — Tenho a mochila cheia.
— Não, não quero.
A jovem insistiu em que queria a mão antes de empreender a travessia, mas ele solicitou:
— Deixa-ma conservar durante o percurso, para tomar conta do leme, enquanto remas.
Os remos tinham cinquenta braças de comprimento e, depois de se internarem no mar durante algum tempo, os dois passageiros avistaram o outro lado. O jovem pôs então o chapéu e desembarcou, enquanto ela, furiosa, o procurava por todos os lados.
— Onde se terá ele metido? Afinal, não me deu nada: nem o ouro, nem a mão!
O rapaz percorreu a margem do mar negro, até que se lhe deparou outra casa em que vivia uma jovem. Aproximou-se e disse-lhe:
— A tua irmã, que me trouxe do outro lado do mar branco no seu barco, pediu-me que te transmitisse cumprimentos.
Ao ouvir isto, ela vociferou, enfurecida:
— Como é possível que o fizesse sem ficar sequer com uma das tuas mãos como pagamento?
Ele abriu a mochila e explicou:
— Paguei-lhe com ouro, mas ainda me resta muito.
Ela ficou ainda mais furiosa.
— Não o devia ter feito por ouro! — Quando o jovem lhe pediu que o levasse ao outro lado do mar negro, assentiu. — Está bem, mas com a condição de ficar com as tuas mãos. — Encaminharam-se para a beira-mar, e ela indicou: — Trá-las aqui, para que as corte.
— Deixa-me conservá-las durante a viagem, para poder tomar conta do leme. Quando chegarmos, poderás então cortá-las.
— Está bem. Assim farei.
Quando se acercaram do outro lado do mar, ele pôs o chapéu, saltou para terra e deixou a jovem a vociferar no barco. Embora tivesse um nariz que media quarenta centímetros, entendia-se muito bem o que dizia.
Ele seguiu em frente até chegar à praia do mar vermelho, onde se encontrava outra rapariga, a qual, para aquecer o quarto, revolvia a chaminé com o nariz, pois a lenha arde melhor quando se espevita.
— As tuas irmãs mandam-te cumprimentos — disse o jovem.
— Como pudeste chegar até aqui e conservar as mãos? — perguntou ela em voz nasalada. — Deviam ter-tas cortado. Que manas aquelas! Eu lhes conto, quando as vir! Levar-te no barco em troca de ouro, quando deviam ter-te exigido as mãos!... — No entanto, a fúria acabou por se dissipar ao fim de algum tempo e perguntou: — Afinal, aonde queres ir?
— Ao palácio submerso que existe no meio do mar vermelho e de que só se vê uma pequena ponta.
Garantiu-lhe que nunca o vira, apesar de ter percorrido o mar em todos os sentidos. Apesar disso, na manhã seguinte, dirigiu-se à praia e começou a gritar.
— Venham todas as aves do céu! Venham, que quero falar convosco!
Em poucos instantes, acudiram todas, grandes e pequenas, às quais perguntou:
— Viram, no mar vermelho, um palácio de que só assoma uma pequena ponta?
A resposta foi um "Não!" colectivo.
— Está bem. Desapareçam!
Depois de se deixarem de ver, tornou a gritar:
— Venham todos os peixes do mar! Venham, que quero falar convosco!
Não tardaram a aparecer e ela perguntou-lhes:
— Viram um palácio submerso no mar de que só assoma uma pequena ponta?
— Não vimos nenhum palácio!
— Então, desapareçam!
Quase em seguida, surgiu uma baleia e, ao vê-la, a jovem começou a ralhar-lhe.
— Porque chegas tão tarde? Não podias ter vindo com os peixes?
E a baleia referiu o seguinte:
— Quando vinha para aqui, passei por um palácio submerso e fiquei com uma barbatana presa num dos cantos. Foi por isso que me atrasei.
— Bem, podes retirar-te.
No momento em que a baleia se preparava para obedecer, o jovem pôs o chapéu e subiu para cima dela. O cetáceo tomou a passar, nadando, diante do palácio e ele apeou-se. De repente, os habitantes abandonaram o edifício, e a área em volta secou por completo.
Apareceu então uma serviçal que tinha saído para ir buscar água potável para a noiva que outrora fora esposa dele. O jovem ainda usava o anel que ela lhe confiara, quando a surpreendera a pisar as terras semeadas. Apressou-se a retirá-lo do dedo e a atirá-lo para dentro do cântaro de água, após o que entrou no palácio com a serviçal. Mas como tinha o chapéu posto, ninguém o podia ver. Ao pegar no cântaro, a mulher notou que alguma coisa soava e perguntou:
— Que tilinta neste cântaro? — Olhou para dentro e encontrou o anel. — Mas é o que entreguei ao meu marido, quando prometi que casaria com ele! Como terá vindo parar aqui?
O jovem, incapaz de conter a alegria, tirou prontamente o chapéu.
Na manhã seguinte, voaram nas asas dela em direcção à pátria do marido, que declarou guerra ao rei. Assim que empunhou a espada, este último perdeu todas as forças e expirou. Ele converteu-se então em monarca e a esposa em rainha, e a sua dinastia continua a governar nestes dias.
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