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16 outubro 2013

Missão De Guerra - Segunda Parte - (Continuação l)

A fazenda estava destruída. Todos os escravos haviam sido mortos, o senhor do engenho e sua família também. As mulheres foram violentadas, algumas crianças, infelizmente, também tiveram o mesmo destino. Havia sangue por toda a parte. Corpos com suas peles arrancadas e penduradas de cabeça para baixo, com moscas e insetos se alimentando da carne morta, ornamentavam o campo. O cheiro de sangue era insuportável e a cena era desoladora. O ataque fatal havia acontecido há dois dias, a força de resistência montada não suportou mais a investida. O cheiro atraía a atenção de animais selvagens.
Lentamente, de meio aos escombros, uma pequena moça, filha do senhor do engenho, começou a sair de um buraco coberto por folhas. Estava deveras tonta, tentou caminhar um pouco, porém necessitou apoiar-se em um pedaço de madeira próximo. Seus olhos inchados observaram a fazenda, estava destruída. Seu corpo estava machucado, sua pouca roupa estava completamente rasgada, em farrapos, com parte de sua nudez à mostra. Pensou procurar pela família, talvez tivessem tido a mesma “sorte” e ainda estivessem vivos. De alguma forma, ela havia sido deixada para trás, sem que tomassem a sua vida. Tentou caminhar novamente, cambaleando e se apoiando, passou por entre as colunas de fumaça, seguiu em direção à casa do pai.


Ela entendia que essa batalha fora perdida, apesar de todas as medidas tomadas. Aqueles monstros continuavam se expandido e eram cada vez mais numerosos. Desde que essa doença chegou ao continente, o “status” da colônia mudou completamente: estavam em guerra contra um inimigo que não podiam vencer. O simples fato dela saber que muitos dos corpos dos militares, e outros homens livres como feitores, capatazes, padres, comerciantes e artesãos, refugiados naquela fazenda, além dos próprios escravos, logo se tornariam novos inimigos, a fazia tremer por dentro, precisava queimá-los o quanto antes.
Foram meses de resistência; porém, tudo em vão. A ajuda que chegou não fora suficiente ou veio tarde demais. Ela imaginava que a colônia havia retornado aos tempos feudais, com muros altos envolta das propriedades, com caminhos bem desmatados para que os habitantes das vilas pudessem fugir para dentro das fazendas. Mas o número de inimigos crescia avassaladoramente, todos antigos aliados transformados pela maldita doença.
Ela entrou na casa, último lugar de refúgio. Era aqui que ela estava antes de ser agarrada e trazida para fora para ser violentada. A porta de madeira maciça estava arrombada. Viu diversos corpos, incluindo os de crianças. Esses monstros não tinham limites, eram feras! Ele se lembrou que havia sido ferida, mordida por aqueles monstros, e também sabia o que isso significava. A infecção se alastraria em, no máximo, uma semana. Teria febre e dores, então morreria, para retornar como os monstros que fizeram isso com ela. O mesmo aconteceria com os já mortos à sua frente.
Adentrou um pouco mais a casa, seguiu para onde estava escondida com a sua mãe e irmãs. Abriu a porta do aposentos, só havia a imagem de corpos dilacerados e manchas de sangue pelas paredes. Ela não conseguia mais chorar, seus olhos estavam por demais inchados. Seu pai, mãe, irmãs e irmãos estavam todos mortos. Só não entendia porque ela havia sobrado. Sentiu vontade de vomitar, mas não havia o que colocar para fora. Voltou-se para casa, observou mais alguns corpos, um se mexeu. Ela aproximou-se para que pudesse ver melhor, era um criança negra, um menino, totalmente coberto por sangue, ainda estava vivo. Ela se aproximou, sentiu pena, não importava se era um escravo, estavam todos na mesma situação.
– Calma! – disse ela se ajoelhando ao lado do corpo da criança. – Vai ficar tudo bem. – mentiu.
Abraçou o menino, olhou para a situação desoladora da casa, o ergueu e seguiu para o seu antigo aposento. Cobriu-se com algumas roupas, envolveu a criança com mais alguns panos e pôs-se a retirar-se da casa. O cheiro repugnante, no interior do aposento, era mais forte. Fitou o corredor de saída da casa, percebeu outras manchas de sangue que não havia visto antes, seguiu para a saída.
Do lado fora, ainda com a criança nos braços, parou de caminhar. Seus olhos fitaram algo que fez seu corpo gelar e a respiração diminuir. Alguns dos corpos dos homens mortos há dois dias começavam a se mexer, não havia mais tempo de queimá-los.
– Ah, meu Deus...
– Bom dia, moça. – disse uma voz de repente, falando em um português fluente. – Eu sou Phillipe, um dos tripulantes da nave francesa que veio dominar essa colônia, e vim ver como estão as minhas crianças. Qual não é a minha surpresa ao encontrar uma bela jovem ainda viva e sem sinais de transformação ou passagem. Hoje é o meu dia de sorte...
A mulher permaneceu imóvel, sem pronunciar um única palavra.
– Vejo que é muda...
Apontou para os novos monstros.
– Sabe o que estou percebendo? Que, quanto mais elevado a infecção por essa bênção que antes eu chamava de praga, mais rápida é a transformação da vítima, estando a vítima morta ou não. Mas você continua inutilmente sã, sem qualquer sinal de uma evolução.
– Por favor...
O monstro sorriu.
– Qual é o seu nome?
– R... Rosa de Lisboa...
– Que nome conveniente... – o monstro se aproximou.
Ela tentou se afastar.
– Como você consegue ainda estar bem? Sem sinal algum?
– Afaste-se! – disse ela, mais por instinto do que por coragem.
– Olhe para a criança em seu colo, já está morta, logo se tornará como uma do meu rebanho...
Rosa observou a criança, seus olhos estavam fechado, estava se transformando. Ela abaixou-se lentamente, colocando o corpo do menino no chão.
– O que você vai fazer? – perguntou ela.
– Eu? Pretendia apenas esperar que minhas crianças viessem à vida, mas, com a sua inesperada e inexplicável imunidade à doença, forçou-me a mudar de planos. Vamos ver se consigo me divertir contigo e transformá-la enquanto minhas crianças se levantam...
– Não! – gritou ela.
O monstro a agarrou pelo pescoço.
– Venha cá!
Foi quando a mulher nada mais disse, porém o seu olhar fixou em um ponto aparentemente ermo da fazenda, às costas de Phillipe.
– Para onde você está olhando? – disse enquanto se virava. – Mas o que...
Phillipe soltou a mulher enquanto fitava três guerreiros distintos, cercados à sua retaguarda de outros guerreiros selvagens.
– Se importa de sair de perto da moça? – disse o primeiro guerreiro em português, porém com sotaque inglês. Suas vestimentas só podiam pertencer a um nobre. Ele portava uma espada completamente diferente de qualquer outra lâmina produzida na Europa, muito parecida com a espada daquela mulher com o rosto oriental, das terras longínquoas. Seu nome era Sir Gregory Wright.
– A gente quer ter uma palavrinha contigo. – disse o outro guerreiro, também na língua portuguesa, porém com um sotaque irreconhecível. Ele envergava uma armadura que rememorava aos guerreiros samurais, apesar do rosto lembrar unicamente um homem inglês. Todos o conheciam pelo nome de Sir Ray Stephen.
– Nossa! – disse a mulher oriental para os dois guerreiros, Lien era o seu nome. – Vocês estão ficando cada vez melhores em suas poses.
– Espero que os filhos de vocês não puxem o humor da mãe... – disse Sir Ray.
– Espero...
Phillipe afastou-se da moça enquanto via os selvagens levando fogo aos corpos que começavam a se mexer. Gritos de monstros sendo queimados em seu nascituro começavam a ser escutados.
– Quem vocês pensam que são, seus tolos? – gritou o monstro, seus olhos começaram a ficar cor de sangue e a sua maça muscular a crescer desproporcionalmente. – Por que interrompem o nascimento de minhas crianças? Querem saber? Pouco me importa! Irei matá-los e torná-los parte do meu rebanho!
Phillipe os fitou com ódio, mostrando os dentes afiados e as garras no lugar das unhas, seu rosto ficou disforme, monstruoso, era uma das criaturas com infecção mais antiga, logo, mais alterada e poderosa.
– Vocês sabem o poder que eu tenho? – gritou. – Sabem? Eu sou um ser superior! Estou criando a minha família! Voltei da morte para isso! Eu vou destruir as suas...
Um punhal cravou-se no rosto do monstro.
– Aí, – disse Lien em português, desfazendo a pose de arremesso enquanto Sir Ray avançava para atacá-lo com a sua katana. – eu sei que você acha que a sua família está grande e tal, mas essa história de família já foi longe demais! Nós seguimos o seu rastro de destruição até aqui e eliminamos todos os corpos!
O monstro golpeou Sir Ray com força, antes que este pudesse desferir o seu ataque, ainda tentando tirar o punhal do rosto. O samurai foi jogado há alguns metros. Sir Gregory avançou em seguida com a sua espada chinesa.
– Nossa! – continuou Lien. – Quando o mundo parar de rodar dentro da cabeça de Sir Ray, ele vai ficar muito injuriado!
– Vocês mataram os meus filhos! Vocês irão pagar caro! – falou, já sem o punhal cravado.
– Você e seus filhos são apenas parte do nosso trabalho!. – disse Sir Gregory desferindo o seu primeiro ataque. – O filho bastardo da rainha será o próximo!
O monstro segurou a lâmina com as mãos.
– Bem que você poderia se render agora... – disse.
O monstro abriu um sorriso irônico.
– Isso não vai acontecer. – mostrou os dentes para mordê-lo e contaminá-lo. – Você é inglês, não é?
Mais um punhal cravou no pescoço do monstro, o irritando ainda mais.
– Opa! – disse Lien passando a espada na alltura do braço que segurava o seu esposo, quase o arrancando. – Carne humana não serve para esse tipo de fim!
Sir Gregory correu a espada na mão do monstro e golpeou novamente, na altura do tórax, porém nenhum dos três golpes pareceu surtir muito efeito. O soco seguinte de Phillipe arremessou Sir Gregory para longe.
– Você está me irritando, mulher!
– Mas eu sequer fiz muitas piadinhas infames ainda. – retrucou ela colocando a sua espada chinesa em riste e arremessando outro punhal e cravando na altura do peito. – Está pelo menos fazendo cócegas? Cheguei à conclusão que essa doença impedem que vocês sintam dor!
– Maldição! – gritou ele. – Quer mulher impertinente! Toda mulher é assim na China?
– Na verdade, minha criação é muito diferente!
A criatura avançou contra ela, tentando matá-la. Foi quando a espada de Sir Ray cortou as costas de Phillipe, quase o cortando no meio.
O monstro gritou pela primeira vez.
– Isso dói!
Sir Gregory veio logo em seguida, golpeando com a sua espada, no mesmo lugar.
– Vai se acostumando!
– Cala a boca!
Só foi possível ver o corpo de Sir Gregory sendo arremessado ao ar e cainda perto da casa onde Rosa ainda se encontrava. Foi impossível continuar acordado.
– Você não entendem mesmo, não é? – disse enquanto se defendia de mais um ataque de Sir Ray com a sua katana. – eu sou mais que um simples homems!
Desferiu um novo ataque, Sir Ray desviou-se.
– Eu tenho o poder de um deus! – segurou a katana com as mãos. – Um deus!
Segurou o pescoço de Sir Ray.
– E você é o quê? Um japonês? Um inglês? Um louco?
O monstro gritou em seguida, arremessando-o contra as madeiras de sustentação da casa, caiu perto de Sir Gregory. Olhou para Lien, esta armou-se
– Sabia que você é uma moça bem atraente? Gostei mesmo de sua aparência. Dá até vontade de esquecer os meus filhos com esses selvagens e levar você e a Rosa para o meio da floresta para que eu possa me divertir em paz.
– Pensei que apenas eu faria piadas de mau-gosto...

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